sábado, 11 de setembro de 2010

Uma viagem Intergalática V

Não era de se admirar que Leson chegasse ao tão esperado encontro com um “terninho” cinza claro sem graça e um sapato bicolor que há anos não sabia o que era um pano limpo.

Ele não levou filmes, nem levou chocolate, nem levou flores. Levou uma canetinha que tinha uma microcâmera instalada e deu à Frida de presente. (Ela nunca usou a tal canetinha já que nunca quis filmar nada e a canetinha fora isso era determinadamente inútil).

Tiveram um dia muito atrapalhado. Era como se os dois fossem completamente opostos... (e eram). Enquanto Frida pensava em comer pipoca, Leson pensava em comer rocambole. Se ela queria dançar, ele queria ficar parado ouvindo a música. Se ela falava de moda, ele falava de tecnologia. Se ela grudava chiclete na mesa, ele organizava todos os pratos de forma simétrica. Definitivamente as diferenças eram imensas.

Leson voltou pra casa tão desencantado, que no caminho parou em uma tabacaria e decidiu fumar seu primeiro cigarro de orégano. Ele condenou o que mais lhe chamou atenção em Frida...sua boca. Ela era tão linda, mas falava muito pra quem não dizia quase nada e Leson antes mesmo de prová-la, a desaprovou. Só ali, naquele momento reflexivo do seu dia murcho e descontente foi que Leson percebeu que a beleza é a última coisa a se considerar. É preciso mais, é preciso sintonia, sincronia, química, física, matemática, conhecimentos gerais, sonho, verdade, sentimento... explosão de sensações positivas. Percebeu que a curiosidade é um bichinho traiçoeiro que pode quebrar as pernas de um curioso se ele não tiver ferramentas pra apoiar-se depois de possíveis desapontamentos.

Para Frida, aquele foi um encontro como um outro qualquer. Ela não criara expectativa nenhuma até porque sabia que os dois não tinham mesmo muito em comum. Sair com Leson foi apenas uma das mil opções que ela escolhera para não passar um dia sozinha.

Quanto mais o tempo passava mais ela percebia que sentia falta de Haustino, embora guardasse pra si e não falasse a ninguém. Sentia vontade de ligar, procurá-lo, mas não fazia. Decidiu por fim que voltaria para Marte pois não via um futuro muito promissor em Plutão. Era um planeta pacato demais pra quem tinha tanta energia pra gastar.

Meio que de supetão, ligou para Leson contando a novidade, o qual lhe deu total apoio na sua decisão. Numa tarde de domingo, despediram-se e Frida partiu não deixando saudades a ninguém.

Enquanto isso, Leson, já quase um bem-sucedido da era digital intergalática, abriu sua livraria virtual para acessos de trezentos gatos pingados do local. O que faria Leson bem-sucedido com tão pouca gente na cidade? Fato é que aquela pouca gente adorava qualquer novidade tecnológica que surgia na cidade e pagava qualquer preço pra ter acesso ao mundo tecnológico e isso era o suficiente para Leson se dar bem na sua profissão.

A livraria de Leson ganhou repercussão intergalatical. Precisou ampliar seu negócio e teve a ideia de montar uma filial em Marte sob a gerência de Haustino. Mas isso ele fez bem depois. Bem depois de perceber que o que ele estava com vontade mesmo era de conversar com Jeikely. Afinal por onde ela andava? Ela simplesmente sumiu. Mudou de apartamento, de trabalho e sabe-se lá mais de quê.

Depois de muito procurar Jeikely pela cidade, Leson deu uma desencanada e decidiu se concentrar no trabalho afim de expandir os negócios. E numa tarde agitadíssima surpreendentemente Jeikely apareceu na loja, movida pela curiosidade feminina é claro. (Ela estava com um ar de superioridade que só vendo!). Apesar de escapar no cantinho da boca um riso de satisfação por estar presenciando de perto o sucesso de seu amigo, ainda assim ela dominava a respiração com muita cautela e propriedade. Ela estava tão bonita... Cabelos presos e leves fios caindo sobre seu pescoço comprido. Leson nunca havia notado que existia um sinal de nascença bem perto de sua nuca pois ela dificilmente prendia os cabelos. Ele nunca antes notou que seus olhos mudavam de cor dependendo da iluminação do ambiente. Ele também nunca havia percebido a graça de menina que se escondia atrás de uma mulher séria. Seu vestido estampado com pequenas tachas imitando baterias recarregáveis, lhe caía leve e moldado. Sua sandália com salto fino de aço inox refletia nas paredes de espelhos e luzes da livraria. Leson ficou babando por minutos infindáveis admirando a beleza que nunca havia notado antes e que esteve sempre bem embaixo de seu nariz. E é claro que Jeikely percebeu. (E que mulher não perceberia!?).

Leson aproximou-se, cumprimentou-a e tentou questioná-la pelo seu sumiço. Jeikely não deu muita trela e simplesmente pediu um cartão para ler um dos livros virtuais da prateleira. Fez questão de pagar, pediu silêncio para a leitura, leu o livro depois de duas horas, agradeceu e antes mesmo que Leson falasse qualquer coisa, ela simplesmente saiu da loja sem olhar pra trás.


(continua...)

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Uma viagem intergalática IV


Apesar de Leson não ter tido uma proximidade maior com Frida quando ainda estava em Leiusk, Haustino de certa forma estreitou os laços entre eles apesar de toda a distância. Como Haustino vivia praticamente mais na casa de Frida do que o inverso, naturalmente se fez necessário que Leson passasse a ligar para a casa dela para poder falar com Haustino. E com tantas ligações propositais, Leson logo tornou-se amigo de Frida.


Em Plutão ele não saberia muito bem o que fazer, nunca estivera pessoalmente com Frida. Embora muito determinado a vê-la, sua timidez e insegurança eram uma espécie de escudo que o impedia de ser natural e isso lhe causava um baita medo. Fora isso, ainda tinha nas lembranças a imagem de seu amigo Haustino todo empolgado falando de Frida com paixão inigualável.


Leson sabia que não seria errado obedecer seu coração. Até porque naquelas 'alturas do campeonato', Haustino e Frida nem estavam mais juntos mesmo! Ainda assim, ele não queria ser mal interpretado por nenhum dos lados. Então respirou fundo e tentou ser apenas um amigo leal. Prometeu a si, não engasgar-se ao falar, nem desviar o olhar quando a olhasse, nem perguntar muito sobre seu relacionamento com Haustino, nem fazer planos... Enfim, resolveu não fazer quase nada, apenas estar com ela.


Após alguns ‘din-dons’ na campainha, Frida nem quis acreditar que quem estava ali diante dela era o intelectual e tímido Leson. Convidou-o para entrar, ofereceu-lhe um chá e pediu ajuda para sovar uma massa para fazer pão caseiro. Leson ainda sem jeito e perdido sem saber como agir por desconhecer seus gestos, seus sorrisos, seus modos de dirigir-se à outrem, simplesmente encarou o novo como um desafio sem dar muita ênfase nos detalhes para parecer que tudo era normal, embora soubesse que ela sabia que não seria normal NUNCA. Porque mesmo Leson não conhecendo o jeito fácil e desinibido de Frida pessoalmente, ela sabia exatamente tudo sobre ele e era como se ela de algum modo, já tivesse convivido com ele.


No calor da emoção de sovar a tal massa de pão, Leson viveu aquele momento como um dos momentos mais importantes da sua vida. É sério!!! Feito criança brincou com Frida como nunca mais havia feito desde sua infância. Fizeram uma 'zona' na cozinha, sovaram, sovaram, sovaram e por fim colocaram de modo muito desorganizado a forma de pão no forno.


Enquanto o pão era assado, Frida ligou a TV, indicou alguns filmes a Leson e pediu licença para tomar um banho. Mantiveram um diálogo à distância, Frida no banho e Leson na sala. Timidamente perturbado em saber que conversava com uma mulher nua embora não a visse, “tremia nas bases” só de imaginar. Depois do curto momento de tensão, Frida apareceu com seu menor shorts, batom vermelho na boca impecável e uma blusinha azul marinho. Frida era provocante e não fazia questão nenhuma em ser muito discreta quando o que queria realmente era chamar atenção. Leson não fazia muito seu tipo mas ela via em seus olhos um desejo varonil e real. E isso era basicamente o necessário para atingir seu ego mais profundo.
As coisas não se estenderam muito. Lancharam naquele dia, comeram o pão que por sinal estava saboroso e macio, combinaram um passeio no final de semana e despediram-se.


Fazia três dias Leson não atendia as ligações de Haustino. Fugia desesperado do telefone, como o diabo foge da cruz. Afinal o que diria? E quanto lhe fosse questionado sobre as novidades? O que deveria de fato responder? - " É cara, fui à casa de Frida, ela me ofereceu chá, fizemos pão caseiro juntinhos, conversei com ela pelada, depois saboreamos o pão que estava gostoso e macio como a pele dela e combinamos um encontro pro final de semana, só isso! " – Leson irritou-se ao imaginar isso e deu um tapa em sua testa como quem dissesse: “ seu otário!”.


Contando os dias, ansioso pra ver Frida novamente, Leson tentava, como um menino imaturo e inexperiente, decorar algumas frases prontas e imaginar o que faria. Não sabia se lhe daria flores, se levaria algum chocolate, se levaria alguns filmes... Ele nem sabia para onde iriam e isso dificultava absurdamente todos os seus planos. Lembrou que conhecia alguém muito legal que certamente poderia ajudá-lo, Jekeily. Mas Jekeily ao saber o assunto não se moveu nenhum pouco a socorrê-lo e disse que estava muito ocupada tentando esquecer quem nunca se lembrava dela. Leson engoliu a seco o desprezo de Jekeily e tentou entender o que não havia entendido, imaginando que quando uma mulher age assim é porque quer apenas ficar sozinha. Então respeitou e tentou de outro modo continuar seus planos nada intelectuais.


(continua...)





sábado, 28 de novembro de 2009

Uma viagem intergalática III

Frida ficou em segundo lugar, feliz da vida! Apesar do olho roxo enfeitando seu rostinho delicado, ela saiu com milzinho no bolso e um sorriso gigante na cara.
Voltou pra casa, tomou uma boa ducha, passou merthiolate em alguns arranhões, deitou na cama de roupão e tudo... Desmaiou. Dormiu até ser acordada por Haustino num tal de din-don estressante. Frida deve ter se arrependido de colocar campainha na sua casa.
Haustino ficou num grau de dúvida fora de sério. Não sabia se elogiava Frida, se parabenizava, criticava, xingava ou sabe-se mais lá o que.
A expressão dele se confundia com algo do tipo : Tô mordido contigo, mas te amo minha nega!
Natural Haustino querer saber o que Frida iria fazer com a tal bufunfa. É a tal da maldita intimidade que faz com que o casal dê satisfação de tudo e divida tudo também.
Mas Frida não é boba. Falou que iria usar para algo bom e só. ( Tenho que aprender com ela, ser bem econômica nas palavras... ou melhor, ser curta e grossa...sem medo).
Falando de intimidade, eu ia até pular a parte que os dois ficaram juntinhos na cama. Mas não é justo. Apesar de ser algo quase óbvio. Frida de roupão, toda cheirosa e jogada numa cama é no mínimo sugestivo. Haustino naquele momento esqueceu suas seis caixas de email e correu para o abraço. Quase foram felizes para sempre até o telefone de Frida tocar. E num tal de : -Atende não amor e -Tenho que atender, Frida acabou atendendo o telefone e pra sua surpresa era Leson.


Leson tinha visto a luta de Frida num dos vídeos mais acessados do youtube. Ligou para parabenizá-la e perguntar o que Frida iria fazer já que estava ficando famosa. Quais eram seus planos e tudo mais... Frida ficou sem entender nada, afinal de contas ela mal chegou em casa. Sua luta foi pela manhã e ela já estava famosa antes de anoitecer? Como assim? Ela correu imediatamente para acessar o site e ver se era realmente verdade. Constatou que era realmente verdade que sua luta era um dos vídeos mais acessados. O título era: A lutadora enferrujada.
Frida ficou de cara amarrada por um bom tempo. Haustino querendo convencê-la de que os detalhes não importavam muito e Frida completamente tensa vendo seu futuro ir para o ralo por causa de um vídeozinho com título infame.


Frida pegou o dinheiro do torneio, deu para Haustino e pediu para ele passar na gerência da agência de eventos e falar com Humberto. Haustino quis entender, mas Frida não estava com cabeça para lhe explicar nada. Disse que Humberto já estava a par de tudo e que era só dar a grana a ele.


Haustino após alguns dias teve seu emprego garantido. Graças à luta de título infame de sua namorada "enferrujada". Por isso que os planetinhas não vão pra frente! Os que precisam de emprego devem pagar para comprar seus empregos? Que deprimente!


Bom, depois disso, bem depois mesmo, Haustino com seu emprego badalado, bombava na cidade e fazia sucesso com a mulherada. Participava das organizações dos maiores eventos da cidade. Mal conseguia conciliar seu tempo para namorar Frida. Talvez essa tenha sido a principal causa da separação dos dois. Em pensar que ele só conseguiu o tal emprego porque Frida se desenferrujou numa luta maluca. Mas a vida é assim mesmo, tem essas surpresas desagradáveis.


Com isso, desanimada da vida e esquecida pelo mundo da fama flash da internet, Frida juntou suas tralhas e decidiu voltar para Plutão. Sequer se despediu de Haustino. Deu uma festinha para suas amigas de uma forma muito discreta e no dia seguinte se mandou.


Haustino só ficou sabendo uma semana depois da viagem. Ficou tão decepcionado com a situação quanto ao seu egoísmo de plantão nas noites de festas intermináveis. Apesar de terem se separado Haustino ainda tinha uma quedinha por Frida. Mas também não se deixou abater. Seguiu seu caminho e se desconectou com o passado.


Dias depois, conversando no chat com Leson, contou a novidade, estava novamente solteiro. Leson, apesar de tanto tempo, sentia seu coração bater forte pela menina Frida, mas não expressou em momento algum com palavras ao seu amigo. Quando soube que Frida havia voltado para Plutão, quase teve um infarto. Quis rapidamente saber o endereço dela.


Um dia depois, Leson recusou o convite de Jekeily para dar um rolé na cidade e foi fazer uma visitinha surpresa à Frida.




(continua)...







sábado, 3 de outubro de 2009

Uma viagem intergalática II


Primeira parte de Uma viagem intergalática: Palavrinhas e Palavrões: Uma viagem intergaláticaI


Ao chegar a Plutão, precisamente na cidade de Ployst, Leson abriu sua mala, retirou seu laptop e acessou um de seus programas preferidos: “Mapeador de hotéis e pontos turísticos de planetas”. Desta vez Leson estava tendo a oportunidade de estar de verdade nos lugares em que ele costumava ficar encantado ao somente olhar pela internet. Bastou um simples click para que em minutos Leson fosse transportado em uma nave compacta ao seu destino.


Ele havia feito uma reserva num hotel famosíssimo, Hotel Plutopohá, até decidir em que lugar morar.


Chegando ao hotel, ficou decepcionado, pois todas as informações que a moça havia dado por telefone sobre o quarto eram inverídicas. Mas como não é de seu perfil fazer confusão, mesmo que seja por uma justa causa, apenas pediu que lhe trouxessem uma lixeirinha com luzes azuis. Ele só não esperava que quem lhe traria pessoalmente a tal lixeirinha, seria Jekeily, a gerente do Hotel. Que foi logo justificando que estava com poucos funcionários e disse que no dia anterior ainda teve que demitir uma funcionária muito louca que adorava passar trote pros clientes.


Leson arrumou suas coisas no seu novo quarto. Distribuiu na cômoda seus objetos pessoais ultramodernos, espalhou pelas paredes fotos de sua família e de seu amigo Haustino, trocou o lençol da cama por uma colcha feita por sua avó e ajeitou outras coisinhas mais.


Plutão que já era um planeta pequeno e vazio estava ficando cada vez mais vazio a cada dia que passava. Muitos que residiam em Ployst, por exemplo, queriam experimentar coisas mais agitadas, conhecer planetas diferentes e mais desenvolvidos. E isso deixou Leson um pouco preocupado. Afinal ele deixou tudo para trás com objetivo de ‘se tornar alguém’ no tal planeta.


Ele não demorou muito para se adaptar no lugar. Só não conseguiu adaptar seu paladar a aceitar os sanduíches de massa gosmenta vendidos em cada esquina da cidade. Ele costumava chamar de sanduíche grude-grude. Não entendia como aquilo poderia ser considerada a “febre alimentícia” do lugar. Mas como nem sempre 2 e 2 são 4, lá haviam outras coisas muito positivas e que eram valorizadas milimetricamente por Leson. As pessoas eram muito hospitaleiras e educadas. Dificilmente (diria até muito raramente MESMO) os noticiários exibiam violência, corrupção e miséria. A única coisa que realmente preocupava Leson era a tal vontade que os moradores tinham de ir embora daquele lugar.


Passado alguns dias Jekeily convidou Leson para dar uma volta na cidade para conhecer alguns lugares. Aquela foi uma forma gentil que ela encontrou de não deixá-lo frustrado com o lugar, já que nem guias turísticos havia mais por lá. Naquele dia Leson chegou cansado, havia conhecido uns restaurantes bem maneiros e se divertido à beça. Ligou pra família, falou com sua mãe, contou todas as novidades com muita empolgação. Mandou um beijo pro pai, um cascudo pra irmã e um abraço pro Haustino.




Enquanto isso na cidade de Leiusk, Haustino tentava uma vaga de emprego numa empresa conceituadíssima, responsável pelos eventos mais badalados da cidade. Não tinha experiência alguma, mas determinação e vontade de trabalhar ele tinha de sobra. E é claro que ele queria unir o útil ao agradável, afinal era festeiro desde muito pequeno.  Por conta disso, dormia ansioso, acordava assustado e passava o dia olhando suas seis caixas de email. (Yes, yes, ele tinha seis caixas de email).


Frida já nem ligava mais pra ele. O máximo que fazia era umas visitinhas rápidas nos finais de semana, já que Haustino falava sempre que o telefone não podia estar ocupado e ele tinha que estar antenado nos seus emails e não podia dar muita atenção a ela. Aquilo tava virando mania obsessiva.


Frida coitada, estava entediada, carente, desanimada, mal-humorada e não suportava mais tal situação. Afinal sempre foi acostumada com mimos, paparicos, atenção aos extremos... Suas amigas cruelmente a apelidaram de TePMica. (Era de dar dó!)


Num estado de desespero total, decidiu pôr a sua colher, mexer seus pauzinhos para reverter tal situação. Tufou o peito e foi à luta. (Hunrum, tufou o peito e foi à luta... Luta de rolar no tatame mesmo).


Na adolescência Frida ganhou várias medalhas de torneios de luta na escola. Ela sabia que um dia aquilo lhe seria útil pra alguma coisa. Então resolveu se inscrever num torneio de luta que estava fazendo a cabeça dos jovens na cidade. A premiação era em dinheiro para os três primeiros lugares e dinheiro era tudo que ela queria pra pôr seu plano em ação. 


Haustino, sentado no sofá da sala, com seu laptop no colo, telefone na mesa de centro e controle remoto na mão, ligou a tv para assistir os noticiários, quando se deparou com a imagem de Frida fazendo alongamento enquanto o repórter lhe entrevistava. - ... Tantos anos sem lutar, o que a fez se inscrever para concorrer a essa grande luta? Você acha mesmo que pode vencer os adversários , que por sinal são fortíssimos? ... Você pretende... (...)


Haustino abriu os olhos o máximo que pôde e gritou: PUTA QUE PARIU, QUE CARALHO A FRIDA TÁ FAZENDO AÍ MEU IRMÃO? 


Ficou lá com cara de " tacho" sem entender nada e sem saber que atitude tomar. Nada adiantaria muito. Frida logo começou a lutar e tudo que Haustino pôde fazer foi torcer para que ela ganhasse a luta.





(continua...)


sábado, 13 de junho de 2009

O livro ( FIM )





Jonas não faz idéia do que acontecerá daqui pra frente. Não sabe o que desejar, não sabe o que esperar...
Letícia não lhe sai da cabeça. Mas ainda assim ele não consegue alimentar nenhum sentimento por ela. Sente-se culpado, pois gostaria de poder tentar... Calado ele pensa consigo:

- Será que valeria a pena procurá-la? Será que valeria a pena tentar gostar dela pra corresponder esse amor? ...Mas ela foi tão firme, tão segura quando me deu adeus. Acho que devo ficar onde estou. Posso magoá-la ainda mais se eu não conseguir amá-la. Poderemos nos frustrar...

O sol invade o quarto de Jonas. Ele abre as cortinas, abre a janela e dá 'bom dia' ao mundo lá fora.
Depois de um banho demorado, Jonas pega seu livro e sai com destino ao parque. Talvez seja isso que Jonas precisa no momento...Relaxar, esquecer o que lhe tortura à mente.
Passa na frente da casa da mulher da janela. Ele recorda sua mão, mão bonita, unhas escuras e um anel perceptível a metros de distância. Movido pela curiosidade, está determinado a ficar por ali, escondido em algum lugar até que ela saia da casa, na esperança de ver seu rosto. Fica em baixo do toldo, o mesmo toldo que lhe protegeu da chuva dias antes.


Depois de um longo tempo... Ninguém aparece, nenhum barulho se ouve vindo da casa, nenhum sinal de vida por ali. Jonas então cansado, segue seu caminho. Deseja voltar um outro dia com mais tempo. Chegando ao parque, senta-se em um banco à sombra de uma árvore. Abre o livro, começa a ler tudo novamente. Parece não cansar de reviver toda a história contada ali. É como se ele buscasse mais explicações. Insatisfeito com a impossibilidade de desvendar os mistérios do sonho associado ao livro, ele se entristece à cada minuto, mais e mais.


Seu semblante fechado permanece por mais tempo do que ele deseja. Determinado, Jonas decide que Letícia fez o que deveria ser feito. Seu sentimento de culpa por deixá-la ir na noite passada, se transforma em algo neutro e insípido, e passa a entender que foi a melhor coisa a ser feita.
Já é tarde e Jonas continua lá, observando tudo ao seu redor. Crianças andando de mãos dadas com seus pais, namorados se beijando, meninas gargalhando, jovens caminhando...


Ele continua triste... Abaixa a cabeça e fica abraçado ao seu livro... Logo depois escuta alguém falar:


- Tem horas?
Jonas permanece de cabeça baixa.
- Estou sem relógio.


- Ah, tudo bem! É... posso saber que livro é esse que você está segurando?


- O livro. De Ágata Nouren. Uma moça deixou em minha porta...


- Ahhh , eu já li esse livro...muito interessante.


- Fala sobre tanta coisa que estou tentando decifrar até hoje. E quanto mais tento, mais confuso fico. Bem, você conhece a autora do livro? Eu particularmente nunca ouvi falar.


- Mas você quer decifrar o quê? O livro fala apenas de um casal que se conhece, se apaixona e depois ela o deixa. Não é isso? O que eu sei sobre a autora é que esse foi o único livro que ela escreveu. E que logo depois da edição, ela entrou em depressão de tal forma que a levou cometer suicídio. Até hoje ninguém sabe se foi por causa do livro, ou se tinha algum problema pessoal... ( a moça senta-se ao lado de Jonas)


Jonas levanta o rosto, mas sequer olha a moça que está ao seu lado. Seu olhar fixa-se no gramado a sua frente...como se só aquilo existisse naquele instante e nada mais...


- Na verdade pra mim tem um significado muito maior. Porque antes de ler o livro, eu sonhei com a história contada no livro. Mas quanto à autora...Que história triste que você acaba de me contar!


A moça incorfomada ao ver Jonas ali tão imóvel e aparentemente tão frágil. Não hesita em perguntar:
- Então é por isso que você está assim ? Realmente é muito estranho isso... Eu entenderia se você tivesse sonhado depois de ler o livro. Mas... antes???!!!


- É realmente muito estranho. Não seria tão intrigante se eu tivesse sonhado depois de ler o livro. Mas me diga, estou assim como?


- Assim...triste, vago. (Fala a moça sem deixar de olhar Jonas)


- Só estou confuso, apenas confuso. Eu nem deveria estar aqui agora. Eu deveria ter ido ao trabalho. Mas não. Estou aqui tentando descobrir coisas que jamais irei descobrir.


- Sinceramente, acho que se você está aqui é porque deveria estar. Eu penso sempre assim! Hoje por exemplo, eu também não fui trabalhar e estou aqui. É a primeira vez que venho a esse parque e tudo aqui é tão lindo! De repente parei e estou aqui conversando com você e mentiria se dissesse que não estou gostando de estar aqui.


- É, acho que você tem razão...


Jonas, move-se lentamente, olha para a mão da moça apoiada no banco próximo a sua perna. Pele clara, unhas escuras e um anel... Um anel que Jonas lembra ter visto antes e que não demora muito pra recordar exatamente o momento e o local. Por um instante ele fica ali parado, sem saber o que fazer ao certo. Será a mulher da janela que tanto Jonas queria ver? Ele tem medo, tem medo de olhá-la, medo de se decepcionar, medo de não entender, medo de se frustrar...medo de tudo. Ele de certa forma criou expectativas e esperou muito por esse momento. O de finalmente ver o rosto da mulher da janela. Agora ela está ali ao lado dele e isso é inadiável. Não há como fugir.


- Você está bem? Seu livro caiu... (Fala ela inclinando-se para juntar o livro do chão)


A moça entrega o livro nas mãos de Jonas. Ele está trêmulo e pálido. Respira fundo e finalmente olha para o rosto da moça. Fica perplexo, imóvel por alguns minutos. A moça automaticamente o olha e encanta-se ainda mais com Jonas. Ambos ficam se olhando por um bom tempo. Jonas toma a liberdade de segurar a mão dela, olha minuciosamente seu anel e tem absoluta certeza de que é realmente a mulher da janela... A mulher da janela de vidro.


- É você... (Diz ele em voz baixa)


- Eu o que?


- Você é a moça da janela de vidro. Há dias quis ver seu rosto. Mas era impossível. Você sequer me dava uma chance de olhá-la... Jonas está com um sorriso "desesperador" estampado em seu rosto.
- Anda me espionando? Você sabe quem eu sou?

- A vi numa noite de chuva , passando pela janela... Mas não conseguia vê-la nitidamente e desde aquele dia, ver seu rosto foi uma das coisas que mais desejei.

- Hum. E agora que viu, o que sente? Qual é a sensação de uma curiosidade acabada? O que você vê em meu rosto? Você está pálido. Parece assustado com o que viu.

- Sinto que minha alma está leve. Minha curiosidade não acaba aqui, ver seu rosto é apenas o começo de tudo que eu busquei. Não estou assustado, estou encantado... Seus olhos, seu sorriso, sua boca... Você é linda!

- Fala como se já me conhecesse, como se já tivesse me visto antes.

- E conheço. É você a moça que aparece no meu sonho, a que eu procurei desde que sonhei. A moça que viveu a história do livro comigo e que me deixou no final sem explicação alguma...E é por isso que eu fiquei assim, impactado.

- Era eu no seu sonho? Você tem certeza disso? Então estava me procurando?

-Nem sei o que dizer, é confuso demais, é absurdo demais. Só sei que era sim você no meu sonho e quem procurei esse tempo todo. De repente você me aparece e é como se eu não estivesse preparado. E nunca estaria! E algo me pede pra que não deixe você ir novamente.

- Sou a moça do teu sonho...

- Sim. É você a doce menina que sorria a cada final de uma frase dita, que me olhava com ternura e que me deixava sempre sem respostas. Sabia que naquela casa na noite de chuva, tinha algo reservado pra mim. Era você.

- Não quero...

- O que você não quer?

- Fugir de novo. Não quero fugir de novo...

A moça o olha , sorri e aproxima-se. Fica mais perto o quanto pode. Jonas toca suavemente seu rosto e num leve suspiro a beija. O beijo mais puro e desejado que sua boca já beijou. Jonas a toma em seus braços como quem não espera ver o fim desse momento tão esperado. Mesmo sabendo que esse momento é apenas o começo de tudo. Se olham... E esse olhar é apenas um de tantos outros olhares.
- Prazer, me chamo Giovanna. Ou me chame como quiser... (rs)

- Como Adriana? Marina? Vitória? Izadora? Hahaha.

- Como quiser. O nome não importa. Independente de nome eu serei sempre esta que você está vendo. (rs)

- Haha. Me chamo Jonas. Mas pode me chamar de "homem robusto e questionador". (rs)
FIM

domingo, 3 de maio de 2009

O livro (parte 8)



Jonas sai às pressas de casa. Quer chegar no trabalho no horário certo pra causar uma boa impressão. Pois aos seus longos 5 anos de trabalho ele nunca havia faltado um dia sequer e abriu uma exceção na sexta-feira quando por fim a sua vida começou a virar de cabeça para baixo.
Jonas é um bom funcionário. Sempre atento, prestativo, dedicado e interessado até mesmo nas áreas que não são as dele.

(...)

Depois de um dia inteiro de trabalho, Jonas vai à faculdade. Ele está com uma aparência cansada. Parece não ter dormido bem o suficiente para deixá-lo disposto o dia todo. Cumprimenta os colegas, vai à mesa e justifica sua ausência para o professor. Une-se a alguns colegas para fazer um exercício em equipe. Sofia, amiga de Jonas é uma dentre os colegas da equipe. Ela não está convencida de que Jonas esteja bem. Ele parece estar em um lugar bem distante...


- Jonas, você está bem? ...

- Por que?

- Você não consegue ler uma pergunta nem responder a nada.

- Desculpa, vou me concentrar, gente.

- Já acabamos Jonas. Sem problemas... Afinal acho que alguém aqui deve estar com um problemão não é!?

- Sim. Estou sim!

Letícia, a menina mais tímida, mais introvertida e mais bonita da turma, coloca seu material na bolsa e sai rapidamente assim que dá a hora do intervalo.

- Você viu, Sofia? A menina vôou. Sempre que ela está perto de mim, ela age assim. Parece ter medo de mim. Eu nunca fiz nada. Nunca sequer falei nada além de "oi" e "tchau".

- Relaxa Jonas, é o jeito dela!

- Vou lá falar com ela. Se for medo, ela vai ter que perder esse medo hoje.

Lá vai o homem robusto e questionador cercar a senhorita tímida e "medrosa". Ela está sentada tomando um copo de suco. Ele se aproxima. Ela não está vendo Jonas.

- Oi menina!

Letícia olha para ele, assustada! Fica alguns segundos parada só olhando para ele. Ele então insiste:

- Oi Letícia.

- Han, oi...

- Tudo bem?

- Sim.

- Mesmo?
- Sim.
- Posso sentar?

- Ah, desculpa. Que falta de educação a minha! Senta, fica à vontade.

- Haha. Você está nervosa, você sempre fica nervosa quando está perto de mim... eu já percebi.

- Percebeu?

- Sim, percebi. Eu só não entendo porque isso acontece. Eu sei que você é tímida, mas tem vezes que você foge de mim, me evita... Você não gosta de mim, é isso?

- Como posso não gostar de você? Han... Quase não nos falamos.

- Gosta ou não de mim? Eu só quero entender, saber o motivo de isso acontecer somente quando está perto de mim.

- Sim, eu gosto de você. ( Fala ela com um tom baixo e olhando para baixo)

- Por que está vermelha? Se gosta de mim porque você sempre foge?

- Fico assim quase sempre. Fujo porque gosto de você.

- Você foge porque gosta? Não deveria ser o contrário?

- Sim. Ah, não sei...

- Por que faz isso? Eu não mordo!! Não precisa fugir de mim. A vida é engraçada! De repente eu estou aqui conversando com você, alguém que foge de quem gosta, enquanto eu estou tentando encontrar alguém que eu gosto. Se eu encontrasse essa pessoa, eu certamente não fugiria.

- Quem você procura?

- Ah, história longa... Uma história bem absurda que está me deixando louco.

- Se quiser conversar...

Jonas sabe que precisa desabafar com alguém. Sabe também que se sentirá mais confortável se falar pra alguém que ele tenha pouca intimidade ou nenhuma. É como se ele buscasse algo novo, reações novas... Pois já lhe bastou a reação de seu amigo o zombando, dizendo que ele estava louco por querer alguém que não existe.
- Sabe Letícia, eu até quero...na verdade, preciso.

- Posso ficar um pouco mais depois da aula, já que você disse que é uma história longa...

-Foi bom vir aqui falar com você. Agora tenho uma outra impressão. Você é legal! Nos encontramos na saída então.

(...)

Se encontram no portão.

- Então Letícia...disposta a ouvir um homem chato farfalhar o resto da noite?

- Haha, sim! Sou ótima ouvinte.

- Para onde vamos então? Sugira um lugar.

- A sua casa.

- Minha casa?

- Você pediu que eu sugerisse. A instituição vai fechar, não tem nada aberto aqui perto... Você mora perto daqui. Na sua casa me sentirei segura. Depois chamo um taxi.

- Ok, vamos à minha casa então...mas vou te falando sobre o que aconteceu no caminho...

Falou resumidamente toda a história para Letícia sem que ela falasse algo sequer. De certo, ela é mesmo boa ouvinte.
Chegam por fim, na casa de Jonas. Decidem ficar na varanda pois o clima lá fora está ótimo...vento, folhas...E então eles continuam a conversar.
- Você deve estar achando tudo isso uma loucura não é, Letícia?

- Não, achei interessante. Me fala como ela era no sonho...

-Linda!!! Ela era linda! O sorriso era o que mais me encantava... puro, terno, sincero, espontâneo...

- Você não imagina quem deixou o livro na sua porta?

- Todos os dias me faço a mesma pergunta: " Quem deixou este livro na minha porta?" Isso martela minha cabeça de tal forma que jamais você entenderia.

- Achei fantástico você sonhar a história que o livro relata. Mas sinceramente acho inútil você querer encontrar alguém que existiu apenas no seu sonho.

- É, eu sei disso. Me sinto um bobo por querer esse sonho pra mim.

- Você não é bobo. Você é um homem apaixonado. Apaixonado pelo irreal, mas é um homem apaixonado. E estar apaixonado não é uma bobagem... Estar apaixonado é sentir no peito uma dor tão forte causada pela ausência de quem gostamos, que até esquecemos dela quando pensamos em estar juntos. Estar apaixonado é dar bom dia todos os dias a quem gostamos por mais que a pessoa não esteja conosco. Estar apaixonado é entender, desejar... Estar apaixonado é ser capaz de fugir por gostar muito de alguém que não gosta de você...

Alguns minutos calados, apenas se olhando... Jonas está surpreso. Ela gosta dele e ele nunca percebeu isso. Tem dúvida de como agir, não sabe o que falar...e ao vê-la tentando se explicar... ele então tenta falar.

- Letícia...

- Eu gosto de você. Sempre gostei de você... Nossa, eu nunca soube expressar isso! Mas eu sempre te admirei, eu esquecia do mundo lá fora quando te olhava... Mas eu nunca fui muito boa com essas coisas do coração...

- Letícia... Não precisa falar...

- Fiquei tanto tempo calada. Tive medo, tanto medo... Fiquei insegura. É uma mistura de tanta coisa. Você nunca me olhava, era como se eu e um lápis fôssemos a mesma coisa. Quando li esse livro, achei a história linda. Quis fazer algo, não sabia o que. Quis você comigo, mas eu não podia...

- Letícia, calma! Olha pra mim, não fica nervosa...não atropela as palavras. Me fala, de que livro você está falando? Você também leu o mesmo livro que foi deixado à minha porta, é isso?

- Fui eu.

- Você o quê?

- Que deixei o livro na sua porta. Mas eu jamais imaginei que fosse acontecer isso tudo... eu queria que você soubesse que eu gostava de você, só isso.

Letícia fica sem jeito. Esse não é o momento em que ela desejava contar tudo ao Jonas. Mas agora é tarde, não tem volta. Ela precisava revelar tudo que esconde.

- Meu Deus! Você? E como vou saber que você está falando a verdade? Letícia, eu quase enlouqueci por causa deste livro. Você não faz idéia do que aconteceu comigo!

- Desculpa, eu só queria que soubesse que existe alguém que gosta de você. Nunca vi você com ninguém. Tive esperanças... Mas também sei que eu não sou o tipo de mulher que você gosta, admira, deseja... Han, melhor eu ir embora!

- Não. Não vai agora por favor. Quis muito saber quem deixou este livro. Você nunca sequer parou para conversar comigo. Quando você iria me dizer isso? Nunca? Estou perdido Letícia, não sei o que pensar...

- Eu ia contar sim! Eu sabia que uma hora eu teria que ter coragem e contar que fui eu que dei o livro de presente a você. E você não ficou assim, aflito, perdido por causa do livro e sim por causa do sonho. O sonho que mexeu com você.

Letícia abre sua bolsa e tira um papel.

- Quase enlouqueci por tudo. Quando li o livro, eu revivi todo o meu sonho. Talvez se eu tivesse apenas sonhado, fosse apenas um sonho que passasse. Mas não. Ao ler o livro eu desejei tudo novamente. Isso me tirou do chão... O que é isso na sua mão?

- É a prova de que estou falando a verdade. Esta é a página do livro. Aqui está.

- Espera... Estou muito confuso! O que vai acontecer agora? Devo esquecer? Deixar passar? Você não é a menina do sonho, Letícia... você não é ela.

- Não, não sou e nunca serei, homem robusto e questionador ! Eu sempre soube que eu não era quem você procurava.

- Por que "homem robusto e questionador"?
- Porque acho você um homem robusto e questionador...

- Desculpe Letícia.

Jonas levanta-se. Fica sem ação. Não consegue sequer olhá-la nos olhos. Ele não quer magoá-la de fato, mas ele sabe que nada daquilo seria possível. Ela realmente não é quem ele procura.

- Não precisa se desculpar... eu já sabia.

- O que quer dizer o bilhete? O bilhete falando do encontro...

- Nosso livro, nosso lugar... Nosso livro, porque agora ele é seu e já foi meu também. E você me encontraria sempre no nosso lugar, mesmo que de uma forma distorcida, mas encontraria. Afinal estudamos juntos.

- Entendi. Você me surpreendeu, sabia!? Muito! Nunca vivi algo parecido. Obrigado por me fazer sonhar. E você é linda! É uma jovem linda! Nunca havia percebido que seus olhos são claros...

- Assim como nunca percebeu que toda vez que eu fugia... era por vontade de estar mais perto. Bem, estou indo, mas antes quero te dizer uma coisa: " Ficam aqui as palavras, as noites de frio e os dias de amor. Ficam aqui meus olhares por ti embriagados de tal pureza e clamor. Ficam aqui nossos sonhos que não passam de sonhos. Fica aqui o único beijo que roubo de ti, eu suponho. Ficam as vozes que falam de coisas indefinidas, ou não. Ficam aqui as lembranças de um encontro com a solidão. Fica também a saudade de um futuro que pode não existir. Fica também a vontade de abraçar o presente pra não fugir. Fica aqui um sorriso incompleto repleto de amor e dor. Ficam aqui meus mistérios por não saber quem sou. Ficam aqui as palavras, os dias de amor e as noites de frio. Fica aqui uma parte de mim, em especial uma parte do livro"

Letícia imprevisivelmente se aproxima de Jonas e o beija. Afasta-se, coloca o papel em sua mão, beija seu rosto demoradamente, diz "adeus" sussurrando ao seu ouvido e pede pra que ele não fale mais nada e então se vai.

Jonas senta-se novamente. Num semblante desesperador ele nada diz, sequer a olha partir...


(...)continua

quinta-feira, 16 de abril de 2009

O livro (parte 7)

É domingo. Dia ensolarado...Daqueles em que o sol queima as ruas e calçadas e nos sentimos acolhidos numa sombra gigantesca de uma árvore.
Jonas liga para um amigo de faculdade e combina de irem a um clube próximo a sua casa. Pega sua mochila, põe nas costas e segue andando pelas ruas do bairro.
Inevitável, a rua da solidão é seu trajeto diário para o trabalho e para a faculdade. É por ela que ele anda neste momento para ir ao clube também. Anda calmamente recordando o dia de chuva em que viu aquela moça na janela. Ele vê o portão abrir, em seguida sai um carro... Não dá pra ver nitidamente quem dirige pelo ângulo em que ele está, mas dá pra notar que é mulher pela mão posta para fora. Nota um anel de pedra verde, bem marcante pela sua forma e seu tamanho. Ele tenta olhar pra dentro do carro na tentativa de vê-la...Quer ver seu rosto. Isso o deixa inquieto. Mas não há tempo. Lá se vai a mulher da janela de vidro sem que seja dado a ele uma chance de matar sua curiosidade. Se vai sem saber da existência de Jonas.
Logo depois chega ao clube, encontra seu amigo, a quem conta sobre tudo o que aconteceu. Seu amigo acha tudo muito confuso e curioso. Mais tarde revela já ter sonhado com pessoas que nunca viu antes na vida e que logo depois as viu em diversos lugares e situações. Jonas fala ao amigo que não tem costume de sonhar, mas que esse sonho o deixou perturbado por tantas coincidências.

- Parecia muito real. Só percebi que tudo era irreal quando vi a data do jornal e me dei conta de que não poderia estar nesse parque durante o dia.

- E você já esteve no parque antes?

- Sim, uma vez à noite. Fui sozinho...fiquei pouco tempo lá depois voltei para casa.

- E esse livro? O que pretende fazer com ele? Desconfia de quem o deixou na sua porta?

- Não canso de ler este livro, é envolvente. Pretendo devolver, mas devolverei a quem? Sequer imagino quem será o dono ou dona dele. Nem há rastros. Há somente um bilhete que marca um encontro com alguém em um lugar indefinido.

- Jonas, tenta esquecer um pouco isso. Você parece estar em um outro mundo. Precisa se distrair. Vamos jogar tênis?

- É, você tem razão... Mas ela era linda! (..) Vamos... mas já sabe que irá perder!

- Hahaha. Apaixonado por alguém que não existe. Você é um louco! E eu nunca perco de você, esqueceu-se disso!?

- Hahaha, devo estar realmente louco!

Horas depois Jonas volta para casa, exausto. Há tempos não se divertia tanto!
Passa de propósito pela rua sombria e calma na esperança de ver a mulher, inutilmente. Não há ninguém na casa, não há carro na garagem, nem luzes acesas.

Chega em casa, toma um demorado banho, ainda de toalha senta-se à mesa, toma uma xícara de café e então se recolhe.

(continua)...